Escrevi este "conto infantil para adultos", depois de ter assistido a um autĂȘntico "assalto" de automobilistas, aos passeios de algumas ruas, de uma freguesia de Penafiel. Sem o mĂnimo de respeito pelos outros, ocupavam a totalidade do passeio, obrigando os peĂ”es a utilizar a estrada para caminharem.
Ă para eles este "conto".
Com carinho... ou talvez nĂŁo.
Era uma vez, numa cidade nĂŁo muito distante, um reino encantado chamado AutomobilĂąndia, onde os carros eram os reis e os passeios os seus tronos. Os sĂșbditos, conhecidos como peĂ”es, eram figuras humildes, sempre prontos a desviar-se, saltar ou contornar os obstĂĄculos que os majestosos veĂculos deixavam no caminho.
Em AutomobilĂąndia, os motoristas, seres mĂĄgicos que acreditavam controlar o tempo e o espaço, tinham o incrĂvel poder de transformar qualquer passeio em estacionamento real. As ruas eram demasiado apertadas, ou talvez apenas insuficientemente dignas para suas majestades metĂĄlicas. Por isso, os passeios eram ocupados, bloqueando mĂŁes com carrinhos de bebĂ©, idosos com bengalas e cavaleiros modernos em cadeiras de rodas.
"Mas, onde estĂĄ o problema?", perguntavam-se os motoristas. Afinal, deixar o carro um pouco em cima do passeio era apenas um pequeno sacrifĂcio em nome de sua majestade a ConveniĂȘncia. "Eles que andem por aĂ, pelo meio da estrada. Um pouco de aventura nunca fez mal a ninguĂ©m!"
As crianças olhavam aquilo e ficavam confusas. "Porque estão os carros no nosso caminho?", perguntavam, enquanto os pais, com um sorriso condescendente, diziam: "Ah, meu pequeno, um dia vais entender que ser adulto é ter direitos especiais. Até os passeios obedecem às nossas vontades!"
Mas, um dia, chegou ao reino uma terrĂvel bruxa chamada ConsequĂȘncia. Com a sua varinha encantada, lançou uma maldição que fazia com que todos os motoristas estacionados em cima dos passeios vivessem uma experiĂȘncia mĂĄgica: acordavam presos dentro das suas prĂłprias casas, com mĂłveis amontoados nos corredores, sem espaço para passar. Por cada utilizador de cadeiras de rodas bloqueado, surgia um sofĂĄ na porta da cozinha; por cada carrinho de bebĂ© desviado, uma mesa trancava a casa de banho.
No inĂcio, os motoristas ficaram irritados. "Que absurdo! Como vou sair assim?" Mas logo perceberam que, tal como eles, os peĂ”es tambĂ©m ficavam presos todos os dias. EntĂŁo, resolveram quebrar o feitiço: estacionaram os carros corretamente e descobriram que, com um pouco mais de esforço, todos podiam viver em harmonia.
Assim, AutomobilĂąndia tornou-se um lugar onde os passeios eram dos peĂ”es, e os motoristas aprenderam que direitos vĂȘm com deveres. E os sĂșbditos? Bem, esses finalmente podiam andar sem saltar obstĂĄculos.
E viveram todos felizes⊠atĂ© a prĂłxima reuniĂŁo do condomĂnio.
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